Eu pescador me confessoArmando Lopes ColunistaReuniram como era hábito na sua Sede, acorrendo à chamada da líder.– “Meus senhores, é preciso que sejamos nós a dar os primeiros sinais claros de austeridade!” – disse ela. – “Para isso, tinha pensado em aproveitar a quadra natalícia para realizarmos as nossas reuniões num lugar mais modesto, fora destas luxuosas instalações. Lembrei-me duma gruta ou duma palhoça…”Vozes discordantes ouviram-se em surdina.
— “Eu acho que é desprestigiante e que nós não podemos perder a dignidade!” – vociferou a camarada Zita que nunca perdeu o velho hábito de ser do contra.– “Uhm, uhm, uhm!…” – fez a doutora Manuela que gosta pouco de ser contrariada. – “Cá para mim podíamos até organizar alguma coisa criativa, por exemplo um presépio ao vivo!”– “Isso, isso!” – disseram logo, em uníssono, os doutores Borges e Aguiar que gostam muito de dizer coisas. – “Temos é que escolher os privilegiados que vão encarnar as principais figuras!”– “Isso eu já decidi, porque para tomar decisões é que sou a vossa chefe! Como tal, e já que tenho os lacticínios associados à minha pessoa, eu serei o bafo inspirador de todos vós!”–“Então e quem será o seu companheiro de bafo?” – perguntaram, curiosos, os restantes.– “O meu companheiro, óbvio e natural, será ali o doutor Alberto João, que já está habituado a mascarar-se e a fazer burricadas.”– “Ioh, ioh, ioh! “ – anuiu o doutor Alberto, com a sua pronúncia de ilhéu.– “Para Virgem Maria, pode ser ali a doutora Paula. Assim como assim, já está habituada a carregar a sua cruz e sempre me fica debaixo do olho.”– “Para São José, ainda estive hesitante entre o doutor Pacheco e o doutor Marcelo. Tanto um como outro falam muito mas não fazem nada, como convém. Mas acabei por preferir o primeiro pois, como já tem barbas, sempre se poupa nos adereços.”– “Agora estou com dificuldade em escolher o Menino Jesus. Não me lembro de ninguém que tenha o perfil e esteja à altura…”– “É fácil!” – gritaram os representantes da distrital de Lisboa. – “Temos o menino-guerreiro!…”– “Uhm, uhm, uhm… está bem, seja!” – disse a doutora Manuela, um pouco renitente.– “Então e nós?…” – reclamaram, estupefactos, os doutores Borges, Aguiar e Rio.– “Vocês podem ser os Reis Magos. Já não precisam de camelos…”– “E, para mim, não se arranja também um lugarzinho?…” – perguntou o doutor Loureiro.– “Sim, para ti está reservado o papel principal! Vais ficar dependurado por uma corda, no cimo do presépio, com umas asas nas costas e um resplendor na cabeça, a acender e a apagar!…”
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