E depois do adeusAdaptação da peça “Viagem à Roda da Parvónia” de Guerra Junqueiro.
A cena passa-se numa arcada do Terreiro do Paço onde chega um Judeu Errante que aparece montado num burro.CICERONE – Então amigo já tem hospedaria? Precisa de escovas para o cabelo? Quer alguma presidência de Câmara Municipal? Quer que lhe leve as malas ou quer a lista das moradias devolutas? Olhe, ali na Rua do Arsenal há cigarrilhas espanholas magníficas, mas se quer o hábito de S. Francisco Xavier também se lhe arranja: isto aqui é só pedir por boca. Não tem senão escolher. Ou vai para a Rua dos Vinagres ou então, se lhe faz mais jeito, pode meter-se na Caixa Geral de Depósitos. No Conselho de Estado não há agora vaga. Prefere ser guarda-nocturno, vendedor ambulante ou “disc-jockey” no Bairro Alto? Chefe dos Serviços Municipalizados não é mau, mas ter o pelouro das Obras é melhor. Talvez prefira administrador do Metro ou da CP. Também pode ser empresário do Parque Mayer, “croupier” do Casino do Estoril ou capataz do Túnel do Marquês. Ou, ainda, presidente de um clube de futebol feminino, roupeiro ou massagista. Escolha: deseja empenhar a consciência, deseja empenhar o relógio? Deseja ser publicitário, consultor de imagem ou prestamista? Pretende ser deputado? Pelo partido do Governo custa-lhe 300 euros, pela oposição 200. Quer casar, quer ser da irmandade dos Consoladores de Tias Aposentadas? Ou prefere ser gigolô, porteiro de “boite”, cabaré ou casa de alterne? Quer elogios nos jornais, na rádio e na TV? Ou, antes pelo contrário, não quer nada disto e deseja ser apenas um brasileiro rico e bem conceituado na sua freguesia? Porque não me fica com esta cautela da Lotaria Popular e com esta relíquia da Irmã Lúcia? Sãoambas autênticas e uma pechincha!
0 Comentários