Eu pescador de confessoArmando LopesColunistaTodas as manhãs, na Avenida marginal – o “caminhódromo” mais belo da vila – entre o Porto de Abrigo e as esplanadas, tem lugar um ritual verdadeiramente singular, cumprido da mesma forma há décadas.Sozinhos ou em pequenos grupos, os reformados abandonam a fria solidão das casas onde habitam e dão início a uma marcha silenciosa ao longo do mar. Resolutos, determinados, levados pela irresistível necessidade de se mexerem e, desse modo, combaterem o entorpecimento que os apoquenta, o cansaço que toma conta deles.
Guiados pelo instinto, percorrem a longa marginal, absorvendo a energia dos primeiros raios de sol e respirando a brisa fresca. Assim confortam o corpo e a alma com este ritual diário de sobrevivência, iluminando-se de imenso. Foi a sabedoria dos anos que os ensinou a desfrutar estes prazeres simples que estão ao alcance da mão. E então é vê-los, a partilhar com os outros caminhantes esta recordação perpétua de dias felizes…Sem que me tenha apercebido disso, com a inconsciência própria das coisas que se fazem por rotina ou necessidade, fui-me integrando no grupo. Aos poucos, dei comigo a percorrer o mesmo roteiro e a saborear os mesmos prazeres.Não sei se estes serão os primeiros sintomas de velhice ou de sabedoria. Não sei mesmo se este será o verdadeiro tributo à alegria de viver. De uma coisa eu tenho a certeza, é a de que estar reformado do emprego não significa estar reformado da vida!
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