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Porquê fazer greve?

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Luís Caixeiro Membro do Comité Central do PCP – Porque raio devo eu fazer esta greve – pergunta-se ao ver o delegado sindical junto do portão – nem sequer sou sindicalizado, trabalho que me desunho, é certo, mas ao fim do mês lá levo o meu poucochinho. Acelera o passo e assenta os olhos no […]

Luís Caixeiro Membro do Comité Central do PCP – Porque raio devo eu fazer esta greve – pergunta-se ao ver o delegado sindical junto do portão – nem sequer sou sindicalizado, trabalho que me desunho, é certo, mas ao fim do mês lá levo o meu poucochinho. Acelera o passo e assenta os olhos no chão, mas ao transpor a linha que define o fora e o dentro da empresa sente a pesada vergonha de ter fugido ao olhar do jovem que lhe estendia o comunicado do sindicato e num impulso, que lhe chegou não sabe de onde, ergue a cabeça, recebe o papel e, com um orgulho para si desconhecido, afirma – vamos a ela companheiro, assim tem de ser.

Durante o resto do dia remoeu, no seu habitual silêncio de trabalhador aplicado, a origem daquela força que o fizera comprometer-se com a greve geral que se realizaria dali a poucos dias. Razões não lhe faltavam, bastava olhar para si e para os seus, porém ele nunca antes se tinha metido em tais aventuras de sindicalistas e – de comunistas – como vociferava o Dr. Tomaz dos Campos, patrão de tantos anos. Agora pensava na folha de salário e subtraia-lhe as facturas do supermercado, da renda da casa, da luz, da água… e não subtraia mais, porque já pouco havia para subtrair. A voz de incerteza da mulher ribombava de lá para cá dentro da sua cabeça – como é que vamos conseguir que o rapaz vá para a universidade, João? – e aos trambolhões dentro da mesma cabeça, sempre a mesma resposta – não sei, amor, não sei. À tarde realizou-se o plenário de trabalhadores e ele encostou-se, como era da sua prática, ao fundo junto do canto mais escondido. Muitos dos seus companheiros de trabalho já não iam aos plenários, diziam que de nada servia, contudo continuava a sentir o dever de ir, embora nunca desse a sua opinião ou sequer tomasse parte em qualquer votação. Hoje, estava lá o jovem que lhe estendera o comunicado pela manhã, era franzino e com um ar vivaz de quem levava a vida a sorrir. Olharam-se como se velhos amigos fossem e essa foi outra surpresa do dia, como era possível se ainda há pouco se cruzaram pela primeira vez? – Camaradas, – argumentava o jovem – não voz pergunto se são ou não sindicalizados, não vos pergunto se são de esquerda, se votaram neste Governo ou na oposição se são católicos ou ateus. Questiono-vos, isso sim camaradas, se têm hoje melhores salários, se o centro de saúde tem médicos para a vossa família, se os vossos filhos têm escola, se os vossos amigos têm trabalho, se conseguem discernir no futuro os dias de felicidade sonhados? Se as estas perguntas a vossa resposta é não, então camaradas, resta-vos um caminho, o de lutar pela dignidade a que tendes direito. Naquelas palavras compreendeu a força que o obrigou a erguer a cabeça ao entrar na empresa pela manhã e com um sentimento de orgulho, agora reconhecido, disse no seu silêncio – foi pela minha dignidade. Levantou o braço pedindo para falar. Os colegas olharam-no e estranharam que ao fim de tantos anos, o Sr. João, homem respeitado mas sempre calado, quisesse agora falar. Na sua voz pausada apenas disse – amigos, dia 30 vamos todos à greve geral, unidos conseguiremos inverter esta política e conquistaremos os dias que sonhámos. Nessa noite quando a mulher com voz de incerteza lhe perguntou – como é que vamos conseguir que o rapaz vá para a universidade, João? – ele tinha uma resposta nova – com luta amor, com muita luta.

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