É no Grupo Etnográfico Danças e Cantares da Nazaré que João Valdemar se sente realizado. Surdo de nascença, aderiu ao rancho porque a irmã, Joana Murraças também fazia parte. “Começou por estar no grupo encarregue da etnografia e transportava o foquim [recipiente de madeira onde os pescadores levavam as suas refeições durante a faina no mar], um baú, uma rede ou outro objecto, até que um dia perguntei à irmã se ele não seria capaz de dançar”, recorda Lurdes Barqueiro, ensaiadora do rancho.
“Via um brilho nos olhos dele enquanto dançávamos e quando experimentou foi uma surpresa. Aprendeu rapidamente, integrou-se bem, é muito responsável e está sempre a perguntar quando é a próxima exibição”, indica, acrescentando que “está sempre atento aos pormenores e já chama a atenção para uma ou outra falha do grupo”.
E como é que uma pessoa que não ouve a música consegue dançar e acompanhar os restantes dançarinos? “Usamos alguns truques, como gestos [a comunicação gestual é limitada porque João Valdemar nunca aprendeu] mas sobretudo o olhar”, refere Lurdes Barqueiro, que adianta não ter receio de fazer atuações públicas, onde o surdo é apresentado nessa condição “não para o exibirmos, mas para fazermos questão de dizer que ele faz o mesmo que os outros dançarinos”.
“É claro que poderá não ter a destreza e o valsear dos outros, porque tem de estar sempre a olhar, porque não ouve, para não perder o ritmo e o compasso da dança”, reconhece.
Joana Murraças pergunta-lhe o que sente quando dança. Por gestos responde que “sente-se bem e feliz e que todos gostam dele”.
João Valdemar já participou numa peça de teatro do grupo e em breve entrará noutra. Tem também no desenho outro motivo de orgulho. O jeito herdou da família e costuma desenhar motivos nazarenos ligados à tradição piscatória e ao folclore, tendo já realizado três exposições no posto de turismo, elogiadas pela população, satisfeita pelo amor que ele sente pela sua terra.
Grupo recria tradições da vila
O Grupo Etnográfico Danças e Cantares da Nazaré, fundado a 25 de Julho de 1997, tem desenvolvido um trabalho de pesquisa do traje e da tradição oral da Nazaré, procurando através da representação mostrar os usos e costumes da vila, essencialmente entre os anos que vão de 1920 a 1940.
O património histórico local recolhido pelo grupo, que inclui um importante espólio de utensílios da época desta terra de pescadores cheia de tradições, está exposto na sua sede, no Centro Cultural da Nazaré (antiga lota).
“Há fogo no mar”, “Vira da Praia”, “Não vás ao mar Tonho”, são algumas das danças.
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