Rogério Raimundo quer a comunidade mais envolvida na protecção de criançasRogério Raimundo presidente da Comissão de Protecção de Crianças e Jovens de Alcobaça São consideradas “bombeiros sociais”. Movem-se em terrenos socialmente complexos. Actuam com de carências de meios humanos e materiais. Insistem na necessidade de combater os males estruturais que conduzem ao “risco” das crianças e jovens. Rogério Raimundo em discurso directo dá conta dos cenários e dos resultados de actuação da “sua” Comissão de Protecção de Crianças e Jovens de Alcobaça. Uma entrevista de António PauloO que é, o que faz e em que âmbito actua a Comissão de Protecção de Crianças e Jovens de Alcobaça (CPCJA)?É um espaço formidável de envolvimento da comunidade alcobacense que queremos alargar muito mais para podermos responder muito melhor, para “o melhor do mundo”- as crianças. É a única organização concelhia onde interagem representantes da segurança social, da saúde, da justiça, da educação, da Câmara, das forças de segurança, das IPSS, das colectividades, do Centro de Emprego, da Assembleia Municipal, cooptados, voluntários… Funciona a dois níveis. A Comissão Alargada tem responsabilidades de informar, sensibilizar, prevenir, envolver a comunidade, reflectir, avaliar, eleger… A Comissão Restrita tem que gerir os casos de menores em perigo (abandonos, negligências, maus tratos físicos ou psíquicos, agressões sexuais, ou carenciados de protecção…). O enquadramento legal assenta na Lei 147/99 de 1 de Setembro, que tudo indica, é valorizada pelo actual governo e que será regulamentada muito em breve.
De uma forma genérica, qual o retrato social do concelho de Alcobaça?Nós não temos, infelizmente porque é uma necessidade, dados e estatísticas que possam responder com exactidão a essa pergunta. Temos apenas dados concretos da nossa intervenção: acompanhamos e ajudamos 160 famílias e cerca de 300 crianças. As maleitas sociais que conhecemos, directamente, revelam que temos de fazer muito mais nas diferentes áreas que afectam estes casos que acompanhamos. Concretizando, precisamos de novas políticas sociais e económicas que coloquem as pessoas em primeiro lugar. Temos que agir mais no erradicar da pobreza, na criação de empregos. Há problemas que exigem políticas de saúde eficazes: alcoolismo, toxicodependência, saúde mental… Temos todos que atacar o drama da violência doméstica e sexual. Que dizer do velho mundo da prostituição? A Câmara tem de responder mais na habitação social. Há muita família desorganizada daí que seja preciso “escolas amigas” para ensinar coisas simples, como a auto estima. As escolas em Alcobaça têm assumido o seu papel essencial e quem as dirige têm sabido atacar, progressivamente, no seu território, os problemas do abandono e do insucesso escolar. Que papel está reservado à comunidade em geral, no sinalizar, no encontrar de soluções para situações problemáticas?Quanto mais a comunidade é solidária e organizada menos casos sobram para nós intervirmos. Se houvesse mais respostas na proximidade, se a Rede Social funcionasse efectivamente, havia mais acções de prevenção e formação junto da família e junto da criança e menos casos concretos de risco / perigo. Pensamos que para além dos técnicos é preciso mobilizar toda a comunidade. Quando é sinalizado um caso, como é que a CCPJA actua?Temos princípios orientadores tendo em conta os superiores interesses da criança/menor. Procuramos garantir privacidade, intervenção precoce e mínima. Procuramos a responsabilidade parental e a prevalência na e da família. Só em último caso vamos para a institucionalização da criança. Sem consentimento não podemos intervir. Reunimos os dados essenciais, confirmando rigorosamente a sinalização. Encarregamos dois gestores para cada caso que serão os mediadores no encontrar das soluções que devem ser assumidas, num “contrato”, em acordo de promoção e implementação de uma medida.Essa actuação está enquadrada de procedimentos agilizados ou reveste-se de muita burocracia?A nossa intervenção deve ser curta e na generalidade não demora mais de 18 meses. Há casos em que conseguimos encontrar respostas imediatas e noutras a situação é muito dramática, com muita lentidão. Há traumas que são escondidos anos e anos, como sejam a violência doméstica ou as várias matizes de agressão sexual e só em situações extremas é que elas são denunciadas e em muitos caso é difícil comprovar.A ligação da CCPJA com a Justiça é um procedimento agilizado?Nas situações de emergência melhorou-se muito, mas é preciso estarmos com canais com mais emissores e receptores, disponíveis para estas missões. É preciso estreitar mais as relações entre a CPCJ e o Ministério Público. Ambos têm que ter mais recursos humanos e meios para que se interrompa mais rapidamente uma situação de perigo/risco com uma criança e respectiva família.Quem efectua os relatórios psicológicos e sociais de um caso sinalizado?A nossa competência é de subsidiariedade em relação à saúde ou à segurança social. Assim devem, estes sectores, elaborar as informações técnicas respectivas. Naturalmente, se tivéssemos um psicólogo e um assistente social, que acompanhassem os gestores de caso e fornecessem os seus relatórios, as decisões teriam a vantagem de poderem ser tomadas mais em cima do acontecimento, em vez de se aguardar por relatórios que, muitas vezes, nunca chegam… A CCPJA de Alcobaça reivindica há muito os serviços de dois técnicos…O ministro da Segurança Social prometeu colocar um em Setembro de 2005. O processo atrasou. Agora fala-se num concurso nacional. Tentámos, sem sucesso por parte da Câmara, que o outro técnico viesse em parceria com o Centro de Emprego. Qual a taxa de sucesso da CPCJA na solução dos riscos de crianças e jovens alcobacenses?Neste ano de 2005 desde que sou presidente, graças à grande equipa que constituímos e que tem dado muita hora voluntária, muita gasolina para as visitas domiciliárias, podemos dizer que temos tido muito caso dramático que foi resolvido e muita situação de risco que foi atenuada. Tivemos 5 casos em que não obtivemos consentimento das famílias ou dos jovens e enviámos ao todo 20 casos para Ministério Público, porque não cumpriam os acordos ou porque considerámos a nossa incapacidade em resolver o problema. Podemos avançar um número redondo: estamos próximos dos 80 por cento de sucesso. Este sucesso deve-se à nossa actividade de mediadores, bombeiros sociais, que ao alertar e envolver os nossos parceiros, familiares, pessoas idóneas, assumem responsabilidades e ajudam as nossas crianças a estarem em ambiente seguro, com afectos. Mas temos a ideia de que há todo um mundo escondido, que não chega à CPCJA, nem aos nossos parceiros, a precisar de escolinhas de afectos e saberes, que ajudem a criar auto estima e projectos de vida, quer aos jovens quer às famílias que estão a passar mal… Pelo que vamos encontrando, é preciso fomentar e até inscrever obrigatoriamente muitos pais em acções de formação parental.
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